QUER BRINCAR? (Capítulo 3)


Mais tarde, naquela noite, Olga dormia, quando ouviu um ruído:
— Tec, tec, tec!

Abriu os olhos, mas estes, pesados, se fecharam. Ouviu novamente o barulho um pouco mais forte:
— Tec, tec, tec!
Levantou a cabeça e olhou para a janela fechada do seu quarto. Uma borboleta negra se chocava contra a vidraça da janela, como querendo entrar. Olga abriu a janela, permitindo a borboleta entrar em seu quarto, seguido de um ventinho gelado.
Olga escuta outro ruído.
Era um som estranho, como se uma criança estivesse chorando em algum lugar. O vento fazia muitos barulhos diferentes, mas Olga tinha certeza que o som estava dentro da casa, não fora dela. Longe, mas dentro, num daqueles corredores compridos.
De repente, uma rajada forte de vento, fez com que a porta de seu quarto se escancarasse bem depressa, fazendo Olga dar um pulo da cama e ficar de pé bem na hora em que o choro chegou pelo corredor, agora mais forte e mais nítido.
Olga esticou o braço para ligar a lâmpada do abajur, mas parecia que não tinha energia. Devagar, apanhou uma vela que estava na mesinha ao lado da cama e acendeu-a.
Saiu pela casa a fora em direção ao choro. A borboleta ia à frente, guiando-a. Quanto mais ela se aproximava do ruído, mais alto ele ficava.
Quando a menina chegou num corredor e parou no início dele, o choro cessou como um eco. Era o corredor comprido e a porta com desenhos em alto relevo, estava no fim dele. Olga tinha certeza que o choro vinha dali e agora, podia ser ouvido, soluços bem baixinhos. A borboleta pousou no ombro direito da garota, que saiu caminhando devagar e em silêncio pelo corredor escuro, com a chama fraca da vela e o coração batendo forte. Chegou perto da porta e a empurrou. Estranhamente ela se abriu facilmente, diferente como da outra vez e depara-se com um mundo de extrema escuridão, que nem a chama de uma mísera vela poderia iluminar.
A menina conseguia ver com dificuldade algumas coisas daquele lugar.
Era um quarto vazio. Enorme. Muito sujo e empoeirado. O chão encardido e fedorento era coberto por uma camada de décadas de sujeira. As paredes eram pretas e inchadas devida a umidade. Tinha uma pequena e alta janela em umas das paredes, onde o vidro encontrava-se vazado, por uma pedra, talvez. Mas o que predominava, era o forte cheiro de mofo.
A borboleta dava várias voltas dentro do quarto, como se estivesse encarando a menina, com um sorriso malicioso, contente por ela estar ali.
O soluço continuava e Olga caminhava pelo enorme quarto vazio. Pisava no chão e ele emitia um baixo ranger de madeira.
Parou no meio do quarto. Os soluços agora estavam tão baixos que era quase impossível de ouvi-los. Olga forçava a audição para ouvir o mínimo ruído. Esticou o braço segurando o pratinho com a vela para iluminar ainda mais, dando uma volta sem sair do lugar. Mas, espere. Viu algo quando a luz da vela passou. Olhou para a esquerda e viu uma coisa. Um vulto sentado abraçando os joelhos com a cabeça baixa. Ele que estava soluçando. A menina arregalou os olhos e uma energia negativa arrepiava o seu corpo. Deu uns passos para trás. Olhou para a porta. Ela ainda estava aberta.
Olhou bem para o vulto. Lhe parecia inofensivo e tomou mais coragem de aproximar-se dele, quando a borboleta negra passou em frente seu rosto. Foi se aproximando bem devagar. A chama fraca da vela quase se apagava com a brisa fria que vinha do buraco da janela. Seu coração batia mais forte e acelerado. A respiração era ofegando e mais rápida.
Ficou em frente o vulto, abriu a boca e com coragem perguntou:
— Por que está chorando? 
A criatura levantou o rosto bem devagar. Para a surpresa de Olga, era uma menina. Muito bonita. A pele era tão branca e os lábios, carnudos, e seus olhos eram negros como a cor da borboleta e brilhavam tanto com as lágrimas, que pareciam hipnotizar Olga, que nem se deu o trabalho de dar um passo de receio para trás.
— Porque não tenho nenhum amigo – respondeu a linda e estranha menina para Olga, deixando outra lágrima cair e abaixando novamente a cabeça.
— Ora... E por quê?
A menina parou de soluçar mudando a sua expressão de tristeza. Olhou nos olhos de Olga, que se afastou um pouco. A garota só perguntou:
— Você quer ser minha amiga?
Olga estava começando a pensar um pouco, pois parecia hipnotizada. Sua consciência estava pesada. Ela lhe avisava que era para dar o fora dali o mais rápido possível. Porque estava falando com ela? Não era uma estranha? Seu pai sempre dizia para nunca
conversar com estranhos. Mas, a garotinha era tão bonita, e parecia tão ingênua e inofensiva. Ainda mais quando deixava uma lágrima cair.
— Quero. Mas, qual o seu nome?
— Sara – respondeu a menina dos cabelos cintilantes. Ela olhava por cima dos olhos fitando Olga e seu olhar era de contentamento acompanhado de um leve sorriso quase imperceptível em sua boca. Um ventinho gelado percorreu a espinha de Olga, que sentiu como um nó em sua garganta, e não conseguia mais falar nada. Agora, ouvira a sua consciência, e queria sair dali o mais rápido possível. Mas, algo lhe prendia ao chão como se estivessem colados. Suas pernas não lhe obedeciam.
— O seu nome? É Olga, não é? – indagou Sara com um sorriso diabólico no rosto.
De repente um vento mais forte, soprou ao encontro da vela, apagando sua chama. O desespero a tomou por completo e definiu o medo que estava sentindo. Não podia mais se ver nada naquela escuridão maldita. Olhou para a porta. Ela a convidava para a saída daquele lugar horrível. Finalmente conseguiu desgrudar os pés do chão e correu cruzando a porta, chegando no início do corredor. Deu uma olhada para
trás. Numa trovoada forte, a porta do quarto vazio se fechou fortemente, fazendo um estrondo.
Olga saiu em disparada para seu quarto, trancou a porta e se enfiou debaixo do cobertor.

Não conseguiu mais dormir naquela noite.

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