Irmão

   Cássio brincava com Caio no quintal de casa. Sempre brincaram os dois, sozinhos. Cássio nunca conseguiu relacionar-se muito bem com os meninos e meninas da escola. Tinha sempre a tendência de arrumar algum desentendimento: a regra da brincadeira, de quem era a bola, a hora de brincar de cada pique. Preferia então brincar só com seu irmão, que nunca discutira com ele. 
   Caio sempre obedeceu Cássio, nunca questionou seus reinados e suas criações fantasiosas, seguia-o quietamente para o lugar que fosse. Naquela época ainda era normal ver crianças andando sozinhas pelo bairro. E era o que Cássio gostava de fazer, explorar o território como um rei controla seu país, ao lado de seu súdito mais leal. 
   O irmão mais velho de Cássio, Leonardo, sempre o achou esquisito. Não deixava que o irmão participasse das conversas com seus amigos em seu quarto. Sempre passava a chave na porta, o que tornava tudo mais curioso para Cássio, que inventava histórias de que Caio estaria passando mal e que precisava da ajuda de Leonardo. Cássio esmurrava a porta e apenas risadas ecoavam do misterioso quarto.
   A mãe dos garotos era enfermeira, o que fazia com que passasse pouco tempo com os filhos. Leonardo fingia não se importar, culpava o irmão pela necessidade de a mãe trabalhar mais desde que nasceu. Como era Leonardo que cozinhava, apenas garantia que o irmão caçula se mantesse vivo. Cássio não nutria nenhum rancor irmão, mas como não tinha também sua atenção, bastava-se da companhia de Caio.
  Caio por vezes desaparecia, mas Cássio não perguntava por ele para a mãe. Por medo de acabar entregando o irmão. No entanto o sumiço de Caio começara a ser cada vez mais recorrente, a ponto de ficar semanas sem retornar. Em uma noite rara na presença da mãe, na hora do jantar, Cássio decidiu perguntar pelo irmão.
  _ Para de inventar coisa _ respondeu Leonardo antes que a mãe pudesse responder.
 _ Eu não queria dizer nada, mas ele pode ter se machucado, sei lá, tem muito tempo que não vejo ele.
 A mãe dos garotos, a principio achando cômica a situação, lentamente depositou os talheres ao lado do prato. Seu semblante foi tornando-se rígido e perguntou:
_ Me fala como que é o Caio, meu filho.
   Cássio achou a pergunta absurda, uma mãe perguntar como é o filho com quem convive, começou a aumentar o tom de voz para a mãe.
_ Ele é da minha altura! tem o cabelo marrom igual ao meu, os olhos verdes e uma pinta embaixo do olho! vocês estão brincando comigo né? 
Leonardo parecia estar segurando uma crise de riso, a mãe permanecia séria.
_ Vem aqui no quarto, Cássio.
 Deixaram a sala, a mãe pegou Cássio pela mão e o colocou de frente ao espelho acoplado à porta do guarda roupa. No primeiro segundo vira Caio, mas ao observar seu cabelo e rosto entendeu.
_ Eu me sinto tão sozinho, mãe. _ E chorou.

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