reflexo

Preso num reflexo
nele meus olhos deslizam 
superfície lisa e fria
côncava e convexa
observo minha silhueta
minhas deformações

estou preso aqui
olhando quem me olha
poderia ter diversos formatos
mas são esses que consigo apresentar
são estas ferramentas que possuo para expressar

minha carne parece parada no tempo
enquanto os pensamentos correm 
energia que dispara e é refletida
sou acertado em cheio por vis pensamentos

sou culpado do que penso?
ou tenho tanta responsabilidade 
pelo formato da ideia
como tenho do formato da minha mão?
tenho escolha de sair da frente deste pedaço de vidro? ou não?

Narciso, o que fizeste contigo?
valera a pena mergulhar em si mesmo?
seria eu profundo o bastante para caber todo em mim?

Estou tão obcecado, 
tento tocar-me, mas é apenas um reflexo
como atingir através do vidro?

Mas então ocorre-me uma coceira
em algum lugar que não aparece 
que lugar é este?
um formigamento, um estranhamento que não alcanço,

lembro-me da palavra costas
nome engraçado, não a vejo no reflexo
mas sei que possuo
possuo uma parte oculta! 
uma parte que não vejo, que não se reflete

estico os dedos para tocar o comixão
e não alcanço
que agonia!
como alcançar aquilo que não se pode ver, que não se mostra?

alguem, por favor,  coce para mim.