Abdução
É
sempre difícil de acreditar quando essas coisas acontecem. Nunca estamos
preparados para ter nosso mundo virado ao avesso, para perder o chão e ser
arrastados por quilômetros pelo vazio. Quando você passou, foi dessa forma que me senti. As estrelas sempre
parecem distantes quando se olha da terra firme. Mas assim que uma delas vem te
encontrar, o mundo ao seu redor muda. Você
tirou tudo o que havia em mim, levou até o que não podia ser levado. O que fazer
quando se é partido em milhões de pedaços e não sabe como juntar tudo
novamente?
“Nós nascemos sozinhos, vivemos
sozinhos e morremos sozinhos”. Essa é uma verdade que levamos como absoluta.
Estamos presos nas nossas próprias cabeças, quanto a isso não podemos fugir.
Quando essa ideia entra em colapso, porém, perdemos tudo. De repente, surge o
pensamento: não estamos sozinhos. A partir daí tudo começa a desmoronar.
Você tenta dizer para os outros,
mostrar-lhes a realidade. Que há muito mais no céu estrelado do que podemos
ver. Mas não, você é o louco. Óbvio que você está errado, que a maciça maioria
está certa, ela tem que estar certa.
“Não fuja da caverna, você não sabe o que há lá fora”.
O descrédito te consome. Me consome.
Você começa a se questionar. Será real isso o que eu sinto? As memórias enganam. A autossugestão é a
morte da certeza. A angústia vem devagar, e, quando você percebe, é ela quem
está no controle. Você se dilacera por dentro, perdido num labirinto sem saída
– e sem entrada. Enquanto a sua carne descola dos ossos, enquanto suas
entranhas dissolvem-se em rancor, os olhares cegos atravessam sua presença, e
você se acostuma com a solidão. No fim, estou encolhido no fundo da minha
cabeça, sem mais sangue para sangrar. Tudo o que sobra é apenas a certeza da
existência, a maldição cartesiana a qual todos nós somos presos.
E então descubro que você nunca esteve aqui. Que nada disso
foi real. Que você foi apenas um
conjunto de luzes e cheiros que meu cérebro idiota interpretou mal. Que você não passava de um reflexo
distorcido, um reflexo meu. Algo que
eu queria tanto a ponto de criar, a ponto de acreditar ser real.
(A autossugestão é a morte da certeza)
O
problema sempre sou eu; afinal, sou
minha única certeza. Estou preso, sozinho, em espaço vazio.
Sothis.
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